segunda-feira, 29 de novembro de 2010

living in

Vocês já ouviram falar em escapismo? É um fenômeno típico do romantismo em que a pessoa foge de realidades desagradáveis através de alucinações e devaneios.

E de cyber escapismo? Longe de soar como doença mental, o cyber escapismo é um fenômeno cada vez mais comum da nossa realidade digital e do desejo que temos de vivenciar a estética e o clima de determinados cenários ficcionais: filmes, livros, músicas, ícones da cultura pop como um todo. E não estou falando aqui de produtos licenciados, mas de uma produção que vem de baixo, dos próprios consumidores.

Essa construção da identidade através de referências pop e a fuga da realidade para a internet não são novas, o que é novo é a intesidade com a qual o processo vem sendo feito e o modo como ícones estão sendo usados para construir uma verdadeira realidade alternativa.

A verdade é que nosso consumo não se limita mais a um único produto. Longe de entrar na seara da transmedia storytelling, a ideia é evidenciar o prolongamento que nós mesmos damos a certas experiências. Como consequência desse fenômeno, blogs e sites passam a nos dar mil referências de como viver determinada realidade alternativa, dentro e fora do computador.


Acho que o melhor exemplo dos últimos tempos é a adaptação de Tim Burton para Alice no País das Maravilhas. Todo mundo queria o tom, a cor, o objeto, o clima do filme em suas vidas. Tanto é que dezenas - ouso dizer centenas - de campanhas publicitárias tiraram proveito disso. Dessa forma, o fenômeno se perdeu um pouco, virou marketing.


Mas Alice não criou fãs tão fiéis como filmes menos conhecidos. Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain, de 2001, deixa suas marcas muito mais visíveis. A busca constante por experimentar a realidade do filme lota as páginas do We Heart It com frames e fotos tiradas pelos usuários (usuárias, né?) que de alguma forma tentam copiar o estilo de Amélie. É a necessidade de viver uma realidade romântica e francesa, em qualquer parte do mundo.


O blog Design*Sponge já faz algum tempo uma série chamada living in em que ele "ensina" como viver determinadas realidades. O blog mostra que objetos e roupas se deve ter para reproduzir determinados universos, e inclusive dá os links de onde encontrá-los. O post que eles fizeram sobre Amélie, por exemplo, foi pedido por diversos leitores, repeatedly.


O fenômeno não se restringe a ícones da cultura pop atual. Mesmo outros países e épocas podem servir de escape para nossa imaginação.. Ou vai dizer que o climinha vintage que reina (mais) na internet (do que fora dela) não é um desejo de revisitar um tempo mais bucólico? It girls mundo à fora fazem parte do processo através de seus blogs. Consigo pensar em duas de cabeça, que apesar de estarem mais urbanas nos últimos tempos, vez ou outra postam um vestidinho esvoaçante e uma coroa de flores na cabeça: Alix e Louise.


A verdade é que o cyber escapismo pode ser utilizado comercialmente, mas não é uma tendência comercial. Tampouco se configura como um comportamento unicamente de fãs, que querem continuar imersos no mundo que rodeio seus objetos de fascínio. É, na verdade, uma prática cada vez mais comum, minha, sua, de qualquer pessoa, de adicionar às nossas vidas, mesmo que virtualmente, pequenos detalhes de realidades que gostaríamos de vivenciar.

Acho seguro, inclusive, afirmar que o cyber escapismo apropriou-se de práticas offline para reconstruí-las no meio digital, gerando repercussão, novamente, no offline. Um nó que mostra bem como está cada vez mais difícil separar as duas coisas.

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